sábado, 2 de setembro de 2017

PESQUISA: Cafona - ensaio sobre brega, preconceito e violência




Alguns materiais de referência


Na peça anterior, "guerrilheiro não tem nome", o tema central da nossa pesquisa foi a Guerrilha do Araguaia, episódio histórico ocorrido em plena Ditadura civil-militar brasileira. Em uma das cenas deste espetáculo era representado um cabaré onde a artista cantava "Torturas de amor", música de Waldick Soriano, e uma virada cênica ocorria trazendo outro sentido para a música, a da tortura da época.
Decidimos, então, pesquisar mais o universo das musicas bregas, cafonas e nos deparamos com o livro  "Eu não sou cachorro, não – música cafona e ditadura militar", de Paulo César Araújo.





Nos primeiros meses de ensaio, este livro foi a principal fonte bibliográfica para a pesquisa acerca das rádios populares e dos cantores e cantoras bregas. Segundo o autor, nos anos 1960 e 1970 a juventude intelectualizada dava mais atenção aos cantores da MPB e às músicas de protesto, taxando os artistas de músicas românticas de “cafonas” e alienados políticos. O raciocínio era: enquanto a ditadura endurecia o regime, os artistas “cafonas” cantavam para o entorpecimento das massas.

A nossa pesquisa, no entanto, interessou-se em compreender “o ontem e o hoje” das relações sociais ligadas a esse gênero musical que sofre grande preconceito de classe e que continua a fazer sucesso e a lançar artistas.



ALGUMAS CANTORES PESQUISADOS

 

 






Muitas contradições apareceram ao analisar estas músicas que, embora colocam como protagonistas figuras populares como a empregada doméstica e o porteiro, por exemplo, reforçam outros preconceitos, como os de gênero e de raça/etnia, principalmente.


Nesse sentido, as obras das autoras Carolina Maria de Jesus e Clarice Lispector adentraram a nossa pesquisa, possibilitando uma construção mais complexa sobre as condições das mulheres brasileiras. 


 Encontro de Clarice Lispector com Carolina Maria de Jesus

 


Na peça "Cafona - ensaios sobre brega, preconceito e violência", utilizamos como protótipo das personagens "femininas", a sabedoria e descrição da crueldade de Carolina Maria de Jesus, e a alienação e ingenuidade de Macabéa, de Clarice Lispector.



Ao escolher o tema, o intuito do núcleo artístico é trazer para o palco o conteúdo do que pode ser denominado “universo brega” e tudo aquilo que o envolve, como, por exemplo: as biografias de artistas surgidos do chamado “povão”, a estética kitsch nas músicas, cenários e figurinos, a Rádio AM como principal difusora das músicas bregas, e o público-alvo, situado nas camadas mais pobres da sociedade brasileira. 

É a partir desse panorama social e artístico que emergem as contradições que o espetáculo pretende trazer à tona, tais como: o preconceito da classe média politizada em relação aos artistas também chamados pejorativamente de “cafonas”, a apropriação mercadológica da indústria cultural em relação a esses artistas, os radialistas como mediadores entre a estética cafona e os ouvintes, a fusão entre o artista e o ouvinte, na música e na vida e, consequentemente, tudo o que daí aparece, ou seja, o machismo nas letras e no lar, a representação da mulher e a projeção de amor e violência contra ela, a exclusão social do ouvinte e a exclusão midiática do cantor.


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O Grupo Teatral MATA! surgiu no final de 2012 como um grupo de estudos sobre teatro e assuntos relacionados à formação histórica e cultural do Brasil contemporâneo. A pesquisa estética do MATA! situa-se nos campos conceituais de processo colaborativo e processo coletivo de criação cujo trabalho de ator, a produção sonora e a cenográfica são voltadas para uma encenação de horizonte épico dialético.